Quantas de nós já não ouvimos ou lemos (nas redes sociais) o termo “Feminazi” por aí? E já alguém pensou verdadeiramente sobre ele? Como é que ele aparece e se instala?
Parte de preconceitos (e pré-conceitos) antigos e conhecidos e reconhecidos (“feministas radicais que pretendem levar a cabo tantos abortos quanto possível”, “Odeiam homens”, “querem a superioridade das mulheres e a opressão dos homens”, “são lésbicas”, “falta-lhes é sexo”,) que acompanham o movimento feminista desde a sua primeira vaga – o sufragismo). É um termo que procura impôr uma verdade e normaliza uma realidade (que é construída), utilizando, logo de início, uma falácia filosófica bastante conhecida: reductio ad Hitlerum ou argumentum ad Hitlerum – uma tentativa de invalidar um ponto de vista associando-o com Hitler ou o Partido Nazista.
O termo feminazi refere-se às “feministas radicais”, um pequeno grupo de “militantes” que se têm vindo a caracterizar (pelo poder instituído, pelo patriarcado, como tendo uma “busca pelo poder” e uma “crença de que os homens não são necessários”. O termo passou a ser amplamente utilizado para o feminismo como um todo, com o objectivo de “marginalizar qualquer feminista como “manhater” rígida e intransigente”. A terminologia reflete ideias comuns de que as feministas “odeiam homens”, são “dogmáticas, inflexíveis e intolerantes” e constituem “uma minoria extremista e sedenta de poder”.
O conceito é um termo perjorativo popularizado num “talk show” americano de rádio por Rush Limbaugh e adoptado por Steve Bannon (em caso de dúvida é pesquisar a informação sobre eles e ver as suas ligações à extrema direita – populista e não populista). Usam o termo é usado para caracterizar as perspectivas feministas como extremas, a fim de desacreditar os argumentos feministas.
Descontextualizado, “feminazi” pode parecer só um termo ridículo: o mínimo de conhecimento histórico sobre o partido nazi, a sua ascensão e as suas políticas permite-nos perceber que Hitler ascendeu ao poder posicionando-se contra o movimento feminista alemão. Foram fechadas clínicas de planeamento familiar e o aborto foi declarado um crime contra o Estado. Várias feministas foram assassinadas ou tiveram de fugir do País. O termo “feminazi” é, além de pejorativo, cruel e anti-histórico.
Para além disso, qualquer raciocínio lógico aponta o óbvio: como comparar duas linhas tão opostas de pensamento como o nazismo e o feminismo – uma que defende a exclusão e a outra a inclusão.
A popularização do termo, porém, acompanha a popularização do próprio debate feminista, infestando todos os temas possíveis, seja em redes sociais, meios de comunicação ou eventos. Os meios de comunicação e a internet, com a invenção das redes sociais, são espaços onde é possível encontrar diversos casos onde o uso do termo “feminazi” seja utilizado para deslegitimar ou descaracterizar o espaço de fala dado a uma mulher feminista.
Basta que uma mulher “ouse” sair do espaço de fala “delimitado” para que seja submetida ao jugo do termo e, em decorrência, desacreditada e calada. E a ideia é exactamente essa: não debater, mas silenciar.
Para quem não acompanha os debates feministas pode parecer exagero mas, nos últimos anos, nomes proeminentes da tecnologia, ciência e literatura tiveram exactamente essa postura em relação às mulheres
O grande trunfo por trás de “feminazi” está em apontar a sua voz como uma voz raivosa, perigosa e descontrolada, criando distanciamento e reserva em relação ao que está a ser dito. Não importa que as exigências sejam totalmente válidas nem os argumentos pertinentes, é importante destruir a possibilidade de diálogo antes mesmo que ele ocorra, evitando que algum “enganado” possa ouvir o que está a ser dito e possa levar os argumentos em consideração.
Por isso, termos como feminazi dizem muito mais sobre quem os profere, já que a necessidade de silenciar e deslegitimar mulheres retratando-as como descontroladas, loucas e incapazes de entender suas próprias exigências não é exactamente nova e tem um nome bastante conhecido: machismo.
Deixo aqui um vídeo de uma jornalista espanhola que, de forma sintética, engraçada e “tão amorosa quanto possível” demonstra de forma simples como deveriam ser as feministas para agradar ao patriarcado. Afinal, nós até já temos direito ao voto, propriedade e salário, que mais é que nós queremos… Aqui: https://brasil.elpais.com/brasil/2018/03/05/actualidad/1520276469_431670.html